terça-feira, 23 de fevereiro de 2010
Poesia Carioca
Índice:
O rio
Versos Curtos
Dois Irmãos
Skyline Carioca
Impatiens
Eu
Carta Testamento
Feitiço
Finados
Um dia após o outro
Certidão de Nascimento
Carência
Semana que vem chega o caminhão
Não amar
Santidade
Insônia
Insônia
Homem de sorte
Às vezes
Eternidade
Será
Livros
Amor de última hora
Degas
Chagall
Klimt
Schiele
Manara
Louvre
Envelhecer
Vocês
Nós
Amor Pleonástico
Cat lover's
Lacrima
Motel Barato
Alice
Mulher super especial
Gatos
Gatos e loucos
Teu peito
Cães
Sexta
Amores Rarefeitos
Dama Vulgar
Adultério
Conversa de Amigo
Doce Riso
Conte outra
Gata sem sutiã
Adios Nonino Felino
Lua Minguante
Amor à Antiga
ATO 1 Restaurante
ATO 2 Motel
ATO 3 Rua em Ipanema
ATO 4 Algum lugar do Planeta
Poeminha cretino para um dia de sol
Incenso
Súcubo
Saudade
Retiro
Doce Insulto
Porto Alegre
Geração 90
Observador
Lisboa
Barroco Brasiliense
Lealdade
Verão 90
Insônia Fútil
Rapaz de Família
Interseção Matemática
Simultaneidade
Não se sinta mal
Bichos
Viver é fácil
Ameaças
Teu ventre
Gatos
Dia 30
Milonga de 3
Múltipla
Ivan
Memória Abreviada
Serial Killer do Jardim Botânico
Voz
Ansiedade
Pateta
Cheiros
Poema convencido que você nunca vai ler
Doutora
Papel Canson
Futuro Improvável
Lembre-se
Ciumentos
Noite
Café da Manhã
Coincidências
Os 4 Gatos
Ezeiza
Mulheres
Maneco
Criança
O rio
Bênção
Traição
Pré-Verão Carioca
Descendo o Alto
Centro à noite
Prédios Escrotos
Bairrismo Carioca
Chuva em Ipanema
Bacalhau do Antiquarius
Amasso na Urca
Chuva
Copacabana
A última megalópole feliz do mundo
A última megalópole feliz do mundo
Conversa
com o jornaleiro,
uma brisa morena no ar,
mau humor do português
do botequim
e a cidade insuportavelmente
feliz com a vitória
do Flamengo.
É assim que eu me lembro do Rio da minha infância.
Copacabana
Copacabana
Quando coloco os meus pés
em Copacabana,
tudo o que escrevo
parece infantil e profano.
A chuva deixa o meu Rio
como um cenário que mais parece
uma contracapa dos discos,
ainda em vinil,
das bandas inglesas nos anos 80.
Deixa na minha boca um gosto de saudade
dos dias que ficava em casa,
sem ir para o Colégio,
vendo Sessão da Tarde.
Amo a Chuva, Amo São Sebastião do Rio de Janeiro e
Amo Você.
Maneco
para Manoel Carlos
pra mim você é
um verbete
do Aurélio
para definir a palavra
Pai.
Divido com você
o amor por Carolina
e o gosto por café amargo.
Mulheres
Mulheres
Mulheres,
armadilhas de Deus
para pegar o Diabo.
Todas merecem ser amadas,
idolatradas e presunçosamente
protegidas.
Os 4 Gatos
Os 4 Gatos
Tenho 4 gatos
onomatopaicos.
O rei gato,
um pingüim felino,
se chama Frajuto.
O que não me dá bola
tem no registro
o nome de Benjamim.
Os dois confiados
que destroem a casa
assinariam o nome
como Bonifácio e Bartolomeu,
mas vêm quando são
chamados de bege e black.
Coincidências
Vamos celebrar
as coincidências.
Verdadeiras Deusas
disfarçadas
de cores, nomes, gostos
e momentos.
Café da Manhã
Até que a gente consegue
não se matar no café da manhã.
Tem dias de paixão que parecemos
casal de anúncio de margarina.
Mesmo quando desarrumo seu jornal,
você fala no seu idioma particular,
o gato morde minha perna e o cachorro fica latindo.
Vou para o trabalho feliz com um beijo na boca
e o pedido para não chegar tarde.
Ciumentos
Ciumentos para Theo, Mônica, Patty, Velho Graça e Suely
Meus irmãos
disputavam,
minuto a minuto,
minha mãe
com o meu pai.
Eu desde pequeno
aprendi a rir
das situações
passionais.
Lembre-se
Vampira,
por favor mantenha o
mundo em harmonia.
Não me peça tanto amor,
cumplicidade ou companhia.
Papel Canson
Desenho teu corpo esguio
numa folha áspera de papel canson.
O telefone toca e
tua voz suave deixa um recado na máquina.
Fingi que não ouvi.
Fingi que não te amava.
Doutora
Doutora
Evite o ácido,
o café
e o chocolate.
Se for usar algum excesso que te faz mal,
então que seja eu.
Poema convencido que você nunca vai ler
Sabe o que me faz rir gabolamente?
Aquele cartão que você me enviou.
Aquele que tem escrito
uma música,
acho que do Chico,
"Olhos nos Olhos".
E quando você chega,
me liga ansiosa do Aeroporto
no cio e repleta de saudade.
O ego fica lá em cima.
Ansiedade
Ansiedade
Você perde a hora,
e eu o humor.
Falta de paciência.
Puro medo da morte
disfarçado de ansiedade.
Medo que ela chegue
sem mandar um telegrama
e não dê tempo para
terminar o que não comecei.
Voz
para Cidinha
Voz de uma gente
sem voz.
Coragem e
honestidade
no limite da responsabilidade.
Nossas brigas
de rompantes
sem arranhões.
Macarrão no domingo?
Molho vermelho ou branco?
Serial Killer do Jardim Botânico
Serial Killer do Jardim Botânico
O telefone me irrita,
a música baiana me causa enxaqueca
a comida gordurosa me enjoa e
o ser humano me incomoda.
Em dias de mau humor
a gente entende os assassinos em série.
Cuidado!
(Risos)
Memória Abreviada
Dentro de bem pouco tempo,
digamos 6 meses,
eu não me lembrarei do seu nome,
nem você do meu.
Somente a coincidência
de assinarmos grandes
nomes de batismo apenas com 4 letras.
Ivan
Ivan
Morreu Ivan
o gato siamês
do meu vizinho
de nome engraçado.
Fiquei triste.
De manhã as marcas
das patas de Ivan
no capô do meu carro preto
me davam a certeza
de que meu corro estava bento.
Bento e protegido
contra acidentes e olho gordo.
Ungido pelos pés sagrados do gato.
Gatos, infeliz de quem não conhece
ou vive sem eles.
Milonga de 3
Milonga de 3
Meu mau humor
não perdoa nem o carinho
da sua milonga de 3.
Ritmo, cadência e sensualidade.
Piazzolamente falando.
Dia 30
Quero te roubar um sorriso
com beijos adolescentes,
te fazer feliz
com carinhos castos
e desejos obscenos.
domingo, 21 de fevereiro de 2010
Gatos
Tem no olhar
o orgulho,
na barriga
a gula,
na vida
a preguiça,
nas gatas
a luxúria,
no cobertor
a avareza,
na janela
a inveja,
no acordar
a ira.
Deuses perfeitos
inabaláveis
por pecados humanos.
Ameaças
Lembra aquela sua idéia
de me acordar de manhã,
num domingo,
com champagne, nescau e racumim?
Pois é, eu não esqueci.
Viver é fácil
Desamarre o sapato.
Fique descalça.
Beba gelado,
direto da garrafa.
Ande na contra mão,
não atenda o telefone,
tire o despertador do quarto
e aproveite a vida.
O ócio e 4 gatos.
Bichos
Bichos
Já poemei
o cachorro
de olhos azuis
como os meus
que são verdes.
O gato branco e preto que
uiva e late
e o cachorro ciumento.
Faltou citar
o gatinho ruivo
que chegou agora
e dorme sem cerimônias
no sofá azul.
Vocês são a melhor
companhia que
a solidão por opção
pode desejar.
Não se sinta mal
Não se sinta mal
Não se sinta mal.
Você é uma mulher especial,
mas me ama demais
e eu amo você sem superlativos.
Detesto relação desigual.
Um beijo e Tchau.
Simultaneidade
Simultaneidade
bem disposta
indecentemente exposta
insistindo na rima
do jeito que a gente gosta.
Interseção Matemática
"A" tem falado, apaixonadamente,
mal de "D".
Comentários que parecem
ensaiados e afinados numa conversa íntima
com "C", que, ciumentamente,
também atira na pianista.
"B" de bobo, está sendo bandeira pura.
Rapaz de Família
Rapaz de Família
Adorei sua irmã,
mas você era mais dedicada.
As duas fizeram de mim
o brasileiro mais feliz.
Insônia Fútil
Insônia Fútil
Se aquieta
minha estante.
Nada de Plath, Pessoa
Almeida, Bandeira ou Quintana.
Na insônia de hoje
só quero ver figuras.
Verão 90
Tua beleza se foi,
perdida no tempo,
consumida pelo câncer.
Restam detalhes de uma cidade,
uma Vespa vermelha
e fotos que não sei onde deixei.
Barroco Brasiliense
Para Renato Russo
Lirismo melancólico,
unindo parte de gerações.
Um barroco brasiliense
poemando o rock nacional.
Lisboa
Ah, Lisboa,
eu como um cão andaluz
perdido
com um Buñuel
na trave
em Borges promessas
não realizadas.
Porto Alegre
Porto Alegre
Alegre porto triste
de verões insuportáveis,
invernos frios,
ruas de paralelepípedos
e mulheres bonitas.
No privilégio de fins de semana
com Mário Quintana,
subscrevo.
Retiro
Puerta de Acalá
aberta
como uma camisa
branca de linho
num verão.
Que Madrid seja e esteja aqui.
Incenso
Acendo um incenso insano.
Enquanto você me tira
da sua pele e da sua alma,
eu apenas envelheço mais um ano.
Poeminha Cretino para um dia de sol
Tenho
uma novidade aí.
Aceito seu convite,
vou usar minha bermuda colorida
no Havaí.
Amor à antiga
ATO 1
Restaurante
Olho no Olho.
Mão na Mão.
Mão na coxa.
Mão no sexo.
Beijo na boca.
Cai o pano.
ATO 2
Motel
Bambina,
molto bene ragazza.
Beijo na Nuca.
Peito na Boca.
Respiração ofegante.
Pau duro,
ao alto e avante.
Uma hora e treze minutos.
Ato corrido.
Coito interrompido.
Intervalo para o chá.
ATO 3
Rua em Ipanema
Choro,
Soluço,
Culpa e
Desculpa.
Tua Boca triste.
Meu Falo ainda em riste.
Fica em Ipanema,
sorrateiramente,
ano que vem,
você faz de novo esta cena.
ATO 4
Algum lugar do Planeta.
Repete-se o ATO 1
e segue a ordem.
Lua Minguante
Lua Minguante
A vida assusta.
Parece às vezes que míngua.
Minguantemente calma
em cada nova lua ansiosa.
Adios Nonino Felino
Meu gato branco e preto
cantarola Adios Nonino.
Parece mentira,
mas juro que é verdade.
Se você vier aqui em casa
eu lhe mostro.
Conte outra
Navalha de fio afiado
corta o fio da meada
da história mal contada
da madrasta má
envenenada com a xícara de chá.
Doce Riso
Risos soltos,
cores disformes e lindas
nesta viagem.
A falsa rosa na TV.
Quero fugir daqui e
dormir com você.
Conversa de Amigo
Você tem falado sozinha
e conversado com a televisão.
Por Deus,
você briga com a apresentadora
do telejornal!
Tenho trabalhado demais e
lhe deixado em casa sozinha,
mês que vem chego mais cedo
para lhe fazer companhia.
Dama Vulgar
Um vestido vermelho
de quinta categoria.
Um comentário sempre insosso
e com português duvidoso.
Ah, mas um peitinho e uma bunda
que na cama me fazem a alegria.
Amores Rarefeitos
Amores Rarefeitos
Fui eu quem te mandou
embora,
mas tua falta me faz falta.
Me falta ar para respirar.
Culpa destes dias úmidos
e amores rarefeitos.
Sexta
Sexta
Hoje não quero ninguém
além de você,
na lingerie preta de sempre,
para transarmos como nunca.
Cães
Incondicionais e fiéis.
Bajuladores autênticos.
Atendem por Gorby,
Fred e Ed.
Transformam meu Domingo
em dia santo.
Teu peito
Teu peito
Me assusto.
Teu busto
não é mais apenas
um busto.
Um seio,
que receio
por um filho no peito,
por um filho no ventre.
Beijo tua boca e esqueço.
Gatos e Loucos
Gatos e Loucos para Nise da Silveira
Quem celebra gatos
e a loucura,
se é que existe definição para Loucos e Gatos,
merece um beijo,
um beijo na testa.
De reverência e admiração.
Mulher super especial
Mulher super especial para Maria Carolina
Só conheço dois tipos de mulher:
as especiais e as muito especiais.
Será que preciso dizer toda noite,
mais precisamente
às duas da manhã,
que você está acima destas?
Cat lover's
Nunca conheci uma pessoa
totalmente desinteressante que goste de gatos.
Nem que seja pelo simples fato
de ter um comentário ronronante.
Mas quem gosta de gatos entende melhor
o ser humano.
No duplo sentido do ser.
Amor Pleonástico
Já te falei que gosto de
beijos beijados
que escorrem escorridos
como o visco viscoso
do suor suado
deste amor amado.
Inconstantemente,
Eu te amo pleonasticamente.
Amor de última hora
Amo, desesperadamente,
um amor de última hora
como se a hora fosse a última.
Livros
Marco meus livros
de um modo fetichista.
Anotações e comentários
como cicatrizes e marcas de amor.
Alguns nunca são totalmente lidos.
Intervalos regulares
e casos de leitura contínua.
É uma questão de momento,
desejo e silêncio.
Será
Será que um dia o amor acaba?
Será que existe rock sem guitarra?
Será que o romântico inocente mente?
Mente inocente deslavadamente.
Eternidade
A angústia e o mal dormir
me envelhecem.
Sinto o peso da eternidade nos ombros.
E uma certeza de ainda ter outra
eternidade por viver.
Às vezes eu me acho um chato.
Encontro defeito em tudo.
Não gosto do jeito que o Paco toca,
acho que Bach deveria ter feito diferente...
Bártok e Miles Davis nestes dias
nem pensar,
pobres mortais.
Às vezes eu reclamo de tudo.
Se está sol,
queria um dia de chuva.
Se está chovendo,
queria um dia de sol.
Às vezes quero Madri,
se em Madri
eu queria estar aqui.
Às vezes eu me acho um chato.
Homem de sorte
Claro que me considero
um homem de sorte.
Dentro de pouco tempo
chegarei aos 30.
Ainda tenho cabelo,
vogais femininas
e consoantes masculinas
para escrever
e me sentir vivo.
Insônia 2
Não durmo
tem duas noites.
Insônia ora remunerada,
ora prazerosa.
E uma angústia
de quem tem que viver 25 horas por dia.
Insônia
A chuva conta no telhado
a história da noite.
A TV ligada,
sem motivo aparente, na CNN,
mostra o que não me interessa.
O gato acompanha
minha falta de sono.
Seis da manhã,
hoje eu não dormi.
Não amar
A dor
de não amar
é faca
de serra.
Corta
e dilacera.
Enferrujada,
deixa o tétano
em gotas de indiferença.
Semana que vem chega o caminhão
Semana que vem chega o caminhão
Rasguei fotografias,
rasguei cartas,
canções e recados amassados.
Na lixeira ateei fogo,
como um altar-mor para amores antigos,
amigos esquecidos,
que só agora reparo
que nunca estiveram vivos.
Carência
Carência
Reclamo da carência
dos meus bichos,
dos meus amigos
e da minha mulher.
Na verdade a carência é minha.
Ainda bem que eles não notam.
Certidão de Nascimento
Sou catalão, sou português,
paraguaio muambeiro,
um pouco índio brasileiro.
Meio judeu, meio cristão
cantando reggae em alemão.
Mas prometo até o fim do ano
dizer te amo em italiano.
Um dia após o outro
Minha idade me cansa,
minha expectativa me cansa e
o café fraco me causa azia.
Não amadureço, não envelheço,
apenas vejo os dias passarem.
Finados
Cinza e verde.
Segunda-feira de Finados.
Visita de família,
como um almoço de domingo.
Nossa suave alegria
de mortos-vivos.
Feitiço
Sinto-me como
um Mago de uma magia menor.
Coloco as palavras
desordenadamente em ordem.
Versos tolos, fúteis e inúteis.
Não quero enfeitiçar ninguém.
Só eu mesmo e o papel.
Carta Testamento
Carta Testamento
Quem sabe eu te deixe
uma carta testamento,
como um momento,
um momento suicida.
Quem sabe eu te deixe
todo sentido da vida.
Impatiens
As Marias-sem-vergonha,
que você insiste em chamar de
Impatiens,
se debruçam na
Estrada das Paineiras.
Só entende a felicidade
desta plantinha colorida
quem ama os dias chuvosos.
Skyline Carioca
Skyline Carioca
No contorno
das montanhas do meu Rio
vejo as curvas do teu corpo esguio.
Cena de um conto,
fotografia em poesia.
Dois Irmãos
Dois Irmãos
Se o Mundo acaba
depois do Dois Irmãos
não se culpe meu amor,
não me culpe por favor.
Versos Curtos
Encurtei os versos
até a altura das saias
das meninas de Copacabana.
Que difícil a arte da vida fácil:
vender o amor
sem ter tempo para ser breve.
Poesia Incompleta
Francisco Alves Editora
©1998
Guto Graça
Quatro Amores de Cidade
"Toda arte é inútil"
Oscar Wilde.
Blue Moon
Bolero Lisboeta
Barcelona
São Paulo
Retratos dos Amores de um Adolescente Enquanto Cão
Marcel Proust
Imbecil Trova Amorosa
A Pretensão
Seus Desejos
Ansiedade Inútil
Rasgo
Rimbaud e Verlaine
Trova Numérica
Amor na Paulista
Sentimental
A Arte de Envelhecer
"Até bem pouco tempo atrás, poderíamos mudar o mundo. Quem roubou nossa coragem?"
Renato Russo
A Amante Virtual
Benjamin Baptista
Cosme Velho
No Glamour Night
Dia de Chuva
Eutanásia
Things Change
Haicai Malfeito
Segundo Haicai Malfeito
Preto e Branco
Occhi Neri
Por Coerência
Última Parte
"Cigarro apagado no canto da boca, enquanto passa o seu passado".
Guilherme de Almeida
Noite de Verão
Mãe
Meu Convite
A Morte do Coleiro
Tarde com Billie
Poesia sem Nome
Meu Amarcord
Meu Amarcord
ou Amigos retrospectiva.
Amigos,
dividimos o bem maior
que é dado aos mortais:
a adolescência,
um estado intermediário entre
a felicidade e a responsabilidade.
O divertimento como preocupação maior
Futebol na rua.
-"Olha o carro!"
Vinho barato,
algumas brigas,
primeiras mulheres
primeiros porres e
rock.
Chega uma hora que é hora de agradecer
por este tempo.
De agradecer a tanta gente,
por tanta coisa.
Ao Artur pela calma, hospitalidade e paciência
ao Garça pelos discos que roubei e pela
companhia dominical no 557
lembras?
o Cau,
não sei bem porquê,
meio Judas,
mas amigo e amado.
Ao Porfírio
pelo mau gosto e alegria.
Ao Marcelinho,
que perguntava:
"Quando a gente crescer será que a gente vai se ver?"
e eu o vejo todo dia após o meio-dia.
Ao Pião
que um dia já soube jogar futebol.
As meninas,
amigas e namoradas,
algumas que ficaram pro Caritó,
outras que casaram e não deixaram
o endereço.
Aos velhos
que curiosamente
ficaram menos velhos
agora que eu também envelheci.
Ao avô que me adotou
e que aceitei com orgulho ser o neto postiço.
Obrigado pela amizade,
pelas viagens Brasil afora seguindo a bola.
Ao Estação Botafogo
contribuindo para meu pseudointelectualismo adolescente.
A Fluminense FM,
que sinto a falta até hoje quando ligo o rádio.
Faço minha homenagem "póstuma":
Não sintonizo os 94.9 no dial do FM. Jamais.
Ao Urgência,
(André, Carlos e Adam),
a mais cult de todas as bandas de rock,
pelos ensaios barulhentos na casa 434 da
Khalil Gibran. E aos amigos que não
considerei, mais por preguiça
que por falta de importância,
um abraço com carinho.
Poesia sem Nome
Bebo lentamente
o xerez do copo
que ganhei do escritor cego.
A noite chegou tão quieta
que eu pensei que ainda fosse dia.
Nesta noite,
sou eu contra o mundo.
Tarde com Billie
Domingo quente e ensolarado
neste resto de verão que se vai.
No som
Billie Holiday
refresca meus ouvidos
acalma minha alma.
Descalço, com os pés na terra,
escrevo estes versos amarrotados
e incontinentes numa tarde azul
sob o olhar do meu pinheiro.
Falta-me o cigarro,
afinal eu não fumo,
para dar uma baforada existencialista
num Gauloises imaginário.
A Morte do Coleiro
A leveza da morte
às vezes é brusca.
Como meu coleiro esmagado
na boca de um gato preto.
A gaiola deserta
parecia uma noite comum
sem o colo materno.
Eu tinha 4 anos
e tratava a morte como rotina.
Meu convite
Entra em casa,
faz barulho,
bate a porta.
Diz que me ama,
tem uma estrela,
não importa.
Mãe
Eu fingia dormir
no colo de minha mãe
ouvindo-a cantar
"over the rainbow".
O quarto escuro não me dava medo,
me dava prazer.
A mínima quantidade de luz
fazia com que eu visse a
Madonna com moldura dourada na parede.
No ar o cheiro de eucalipto.
Um dia eu acordei e perguntei:
Mão, cadê você?
Noite de verão
A estrela pinga no meu olho
uma poeira.
Penso em amor.
Penso em comida.
Penso em besteira.
A lua crescente
ilumina o outro lado,
pedaço da luz sem luz.
Como um letreiro quebrado.
Algo meio mal iluminado.
Vejo o contorno circular completo,
ainda que na penumbra.
Gosto de rir da Natureza,
tanto quanto gosto de rir com naturalidade.
Celebro este momento débil,
como quem faz uma prece tola.
Chego em casa,
acendo um incenso e
fico ouvindo Sinatra.
Sinatra com Jobim
cantando pra mim
"Fly me to the moon".
Por coerência
(para Gorby)
Por coerência,
mais que inspiração,
tenho que escrever este poeminha.
Afinal, ele é o culpado de tudo.
O Gorbelho,
meu cachorro espacial.
Admito, sem vergonha,
que ele é meu professor,
me ensinou que na vida
nem tudo tem que ter porquê,
que amar é bom demais
e que sentimentos não se explicam.
Tudo isto
muito mais barato que anos de terapia.
Adoça meu jeito amargo e descrente
faz com que eu acredite
que viver
até que é bem razoável.
Oci ciornie
(para Fred)
Desenhando buracos no jardim,
uivando na madrugada ou
pedindo carinho carentemente inoportuno.
Eu te amo, Fred.
Meu occhi neri
balança o rabo
mas é orgulhoso.
Demonstra o ciúme de um modo mexicano
e berra nas noites
fazendo os vizinhos urrarem!
(até mesmo aqueles que mais amam os cachorros).
Tenho uma vingança bissexta:
acordo-o de madrugada com meus cutucões sonoros:
Fred, Fred, Fred.
E fecho a janela gargalhando com Carolina.
Tem mais de 50 apelidos,
personalidade humana e
guarda a casa dormindo no portão.
Tem tratamento de filho,
não pode ser chamado de cachorro ou cão.
Preto e branco
(para Frajuto)
Presença suave,
impertinente e indiferente,
exercita um balé esquisito
quando caminha, nada silenciosamente, pela casa
na madrugada
acompanhando minha falta de sono.
Felinamente possui
um desajeito humano e cômico
coroado por um rabo cortado.
Criatura ronronante e
dorminhoca que se espreguiça
como quem ouve um reggae.
Desliza sua mão sobre o meu rosto
oferecendo um carinho de presente.
Invade minha cama,
meu colo e minha insônia
com a mesma desinibição
com que entrou em minha casa.
Meu Wrong and Right
Meu gato black and white.
Segundo Haikai Malfeito
Primavera,
e não abre nenhuma flor
no meu desfolhado coração de Outono.
O que interessa isto,
ou minha noite sem sono?
Things Change
É claro que as coisas mudam
e que o tempo existente neste mundo
não deixa tudo explicado.
Mas,
será que você se lembrou de ver
um filme que passou hoje na TV?
Aquele mesmo filme que vimos juntos,
quando a gente falava bobagem,
falava de amor
e fugia de filas nos cinemas.
Que bobagem a minha.
As coisas mudam rápido demais.
Rápido, sem dar tempo
que reparemos na essência
das filigranas rotineiras.
Eutanásia
Eutanásia.
Eu tô na Ásia.
Se um dia
eu ficar pro lado de lá,
meio depois do Japão,
dá uma mão.
Aperta um botão.
Dia de Chuva
Deixo a chuva molhar
o pára-brisa do carro amarelo.
Pelo vidro molhado,
um mosaico.
Vejo o mundo parecer uma pintura
impressionista.
No Glamour Night
Insônia por opção.
Dois trash movies.
Dois goles de Jack Daniel's
Coca-Cola e pipoca de microondas.
Sem echarpes de seda,
som de salto alto no corredor,
olhares lânguidos, batons e champanhe.
Sem desesperos, dores, melancolias profundas,
blues, porres e dramas também.
Palavras sem trato ou poesia.
Rádio AM
e seus comunicadores que
"are never sleeping."
Apenas uma noite
de quem não dorme
e conta sozinho
as estrelas no céu nublado.
Cosme Velho
Estas madrugadas
de Inverno,
ao pé do Corcovado,
me dão um gosto paulistano.
O bairro pacato,
adormece calado,
e ninguém repara
a minha solidão.
Fico na dúvida
entre minha morena
e uma caixa de remédio
para dar fim a este tédio.
Benjamim Baptista
A ladeira onde o carro passa,
atapetada por folhas suicidas,
faz o Verão parecer uma sagrada noite de Outono.
Se amanhã é quarta-feira,
por favor, deixem minhas cinzas
jogadas ao vento.
As folhas que o vento leva
contam a velha história nova.
E se a brisa bate leve
vou em paz e me sinto breve.
A Amante virtual
Nos comentários
Ela existe.
Na boca e cabeça
dos outros.
É a amante virtual.
(PAUSA PARA MEDITAÇÃO)
Até que não é mau...
Sentimental
Sentimental.
Qualquer dramalhão da TV,
história triste
ou canção melada
me umedece os olhos.
Choro diante do espelho,
me vejo sozinho
entre tanta gente.
Eu odeio domingos ensolarados.
Amor na Paulista
Queria te roubar um beijo
num conversível lilás
na Paulista
após a meia-noite.
Aumentaria o som.
Cantaria cheek to cheek
junto com a grande dama.
No meu pescoço,
você enroscada como
uma echarpe cinza.
Eu daria uma baforada
no meu cigarro imaginário e
me ajeitaria no sobretudo,
olhando para você.
Este seu rosto inocente
com olhos fechados me diria:
"Vá em frente."
A boca borrada de batom
me deixaria explodindo de excitação.
Pousaria a mão,
indecentemente,
nessas pernas moldadas
para uma diva de cinema.
As ligas na altura da coxa
me deixariam de quatro,
como um trouxa,
um tolo sentimental,
um insano e irracional.
Eu cantaria,
berraria que a amava
e aceleraria na Avenida.
Quereria você como nunca.
Só que me restou
apenas um blues.
Trova Numérica
Ela tem 34,
estimulante
como uma ninfeta de 16.
Quando me chama
não conto até 3.
Rimbaud e Verlaine
Rimbaud e Verlaine
devem estar mortos,
podem estar vivos.
Foram separados
como dois amantes inimigos.
Eu, como leitor de seus livros,
fiz os dois se tornarem amigos.
Estão juntos, ao menos em minha estante.
Talvez agora,
coleguinhas,
estejam felizes.
Fazendo sonetos
e olhando para Ganimedes.
Rasgo...
Rasgo a Jardim Botânico,
acelerando velozmente
numa noite fria.
Deixo o vidro aberto
para receber o vento gelado em meu rosto.
Fecho os olhos insandecidamente.
Quem sabe encontro você?
Ou me choco fortemente
e abraço um poste,
dando um beijo suado na morte?
Ansiedade Inútil
O relógio apita e avisa
que a madrugada avança.
Insone,
vestido com um pijama cinza,
conto sozinho as estrelas num céu nublado.
Quem sabe você entra por aquela porta?
Quem sabe o telefone toca?
Não adianta.
Nas quartas-feiras
nada acontece.
Seus Desejos
Sei o que você quer.
Não sou paranormal, clarividente,
nem possuo bola de cristal.
Mas eu a conheço muito bem.
Seus desejos fazem parte
dos meus desejos.
É difícil.
Naquele domingo que lhe virei as costas,
matei-a afogada numa garrafa de vodca.
Hoje em dia quero lhe mandar um recado.
Escrever num outdoor
com letras garrafais:
"DESISTA, MINHA GATA,
VOCÊ NÃO EXISTE MAIS."
A pretensão
Você poderia ser Simone de Beauvoir,
uma líder feminista.
Eu, Jean Paul Sartre,
um filósofo existencialista.
Planos para dividir,
marcas para deixar,
rotina para cumprir,
caminhos para trilhar.
Podemos fazer tudo direitinho,
dentro do que chamam de convencional,
e continuamos a ouvir:
"Isto não é normal."
P.S. Sempre que leio isto
dá vontade de rir da nossa pretensão.
Imbecil Trova Amorosa
Se eu fosse um vulto histórico,
alguém importante,
digno de uma biografia,
não te daria
nem bom-dia.
Como não sou nada,
pouca coisa para ser considerado,
quero ser teu namorado.
São Paulo
Eu tinha fumaça nos olhos
e poeira na alma.
Por entre uma cortina,
formada pelo ar,
de qualidade razoável,
eu enxergava
minha linda
mulher feia.
Eu te amo, São Paulo,
minha Tóquio
que fala Português.
Barcelona
Minha catalã posair
com quem tive meu affair.
Que desdenho você pode ter deste mundo.
Você deixa qualquer um atordoado.
Quem a conhece, ou por você passa,
cai apaixonado.
Depois de você,
a minha flor vermelha é roja
as louras são rubias
e meu coração
ficou no ritmo de uma paixão.
P.S. Não se preocupe con la movida madrileña
Bolero Lisboeta
Em Lisboa,
me sinto à toa,
sem santos mistérios
ou pessoa em pessoa.
Blue Moon - Poesia Carioca
Vou sobrevoar o Rio
num aeroplano púrpura.
Por pura loucura,
viajar na noite de lua cheia.
Acelerar mais forte,
ver teu rosto refletido na Guanabara
numa noite clara,
sem tramas ou dramas,
baladas, drogas ou rock.
Queria te ver
bailando a dança do ventre,
envolta em crepes de seda siderais
como as venusianas sensuais.
Minha loucura
desemboca nas artérias da cidade.
Chego sozinho como um cão que uiva.
Onde estará aquela ruiva?